como reduzir a violência

Como contribuir para a redução da violência?

O que vais encontrar neste artigo: 

  • A problemática do escalar da violência
  • Compreender o conceito de violência redentora e a sua contribuição para a polarização
  • Perceber o conceito de violência micro e macro
  • Identificar a violência que exercemos nas nossas ações e discurso
  • Como podemos contribuir para reduzir a violência no nosso sistema
Nos últimos anos temos assistido a um crescendo da violência a nível global. Seja nos conflitos armados, ao ressurgimento de movimentos extremistas e sexistas e a uma polarização cada vez mais acentuada de ideias, que nos transporta para um lugar perigoso. Mas afinal, será possível contribuir-mos ou não para reduzir este escalar de violência? Lê aqui o artigo completo.

Não é preciso estar muito atento às redes sociais ou notícias para perceber que temos um crescendo de violência em mãos! Nos últimos anos temos assistido ao início de pelo menos 2 guerras sangrentas, e como se não bastassem as guerras, temos ainda o ressurgir de movimentos, outrora mais adormecidos, e que achávamos, terem ficado lá bem atrás no tempo, como é o caso dos movimentos de extrema direita, que têm crescido como cogumelos, por toda a Europa. 

Mas a violência mais tradicional, digamos assim, aquela que atenta contra direitos humanos, contra valores e princípios nobres, não é o único tipo de violência com que nos deparamos hoje. Existe uma nova, que não é assim tão nova, violência que emerge contra estes movimentos que atentam contra a liberdade, é essa a violência redentora. 

A violência redentora e o problema da polarização

A ideia da violência redentora é a de que “a violência é um mecanismo útil de controle e ordem e por isso um mecanismo necessário para livrar o mundo do mal e a única forma de obter/alcançar a paz. Por outras palavras, é uma forma de legitimar o uso de violência quando esta é utilizada em nome do “bem” ou de uma causa que consideramos nobre.

E porquê falar de violência redentora? Porque em cenários extremos, como aqueles que vemos hoje, onde é claro para nós quem representa uma ameaça ao que consideramos ser o correto (isto partindo do princípio que caminhamos para a visão partilhada de uma sociedade justa, igualitária e que respeita todos na sua individualidade e diversidade), é fácil cair no outro extremo, o extremo de defender/ proteger essa realidade, que queremos preservar, mas de um lugar de intolerância, resistência e também violência para com aqueles que estão no outro polo. Aqui neste polo atua a violência redentora, a violência que protege o bem e luta contra o mal. 

Dois polos, diferentes perspetivas, mas ambos alimentam este sistema, que nos transporta a largos passos para um escalar de violência. 

E é este o grande problema da polarização, afastamo-nos do campo de diálogo ou cooperação e mantem-nos num espaço de luta e exigência intransigente, onde nenhum dos lados se vê. E como é que podemos reduzir a violência aqui neste sítio? Não podemos. 

Primeiro: distinguir micro de macro violências

Antes de mais é preciso distinguir micro de macro violência. Quando escutamos a palavra violência, tendemos a associar a atos mais brutais, como guerra, agressões verbais, gritos, violência física/agressões físicas (macro). Mas na verdade a definição de violência é bem mais complexa. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o conceito de violência é definido como “o uso intencional de força física ou poder, real ou em ameaça, contra si mesmo, outra pessoa, ou contra um grupo ou comunidade, que resulte ou tenha alta probabilidade de resultar em lesões, morte, danos psicológicos, deficiência de desenvolvimento ou privação”. 

Já aqui nesta definição temos em destaque dois aspetos importantes e que caracterizam a micro violência, tendo aqui como destaque o exercício de poder (portanto já não se trata apenas de força física) e por consequência o impacto psicológico (não tendo apenas consequências a nível físico)!

Quer isto dizer que, dentro da micro violência podem enquadrar-se inúmeros atos, também eles passivos de contribuir para o escalar da violência, e que não são necessariamente atos de violência extrema como é o caso da violência armada. Temos como exemplo de atos de micro violência, que vivemos e praticamos no quotidiano: 

  • Impor as nossas ideias ou soluções sobre a vida de outras pessoas, é uma forma de violência;
  • Criticar, julgar, apontar o dedo ao outro é uma forma de violência; 
  • Exigir ou esperar que o outro cumpra com as nossas expectativas é uma forma de violência;
  • Invalidar, minimizar, as emoções e experiências de outra pessoa é uma forma de violência;
  • Assumir ou retirar ilações sobre a realidade sem ter toda a informação sobre a situação, é uma forma de violência; 
  • Não respeitar os limites do outro, é uma forma de violência;
  • Desresponsabilizarmo-nos sobre o que acontece nas nossas vidas, sobre o que sentimos, e colocarmos toda a responsabilidade sobre o outro, é uma forma de violência;
  • Inclusive, fazer tudo isto, connosco mesmos, na nossa cabeça, é também uma forma de violência;

Ganhar consciência das nossas micro violências

Sair da polarização, quebrar ciclos de violência, pede-nos antes de mais, tomar consciência de dois aspetos importantes:

  1. Será que o meu discurso se enquadra num polo extremado? 
  2. Que micro violências (de acordo com a lista em cima), trago para a minha expressão?

O primeiro passo e mais importante para reduzir a violência, começa por nós mesmos, por mudarmos a forma como nos expressamos e como lidamos com os temas que são importantes para nós. E para isso é preciso reconhecer, que talvez nos estejamos a expressar de um lugar reativo, emocional e possivelmente extremado, ainda que seja por uma boa causa. 

Embora a cultura ou a estrutura social em que crescemos nos tenha ensinado que somos os bons e que a razão está do nosso lado (se formos a ver bem, também aqui o começo da polarização, nesta ideia de bons e maus/certos e errados), a realidade é bem mais complexa do que limitarmos a existência de cada um a apenas dois lados. 

Marshall Rosenberg, o pai da Comunicação Não Violenta, dizia que “a violência era uma expressão trágica de uma necessidade não satisfeita”. Se pensarmos bem, nos mais variados atos de violência que vemos acontecer ao nosso redor, se realmente conseguirmos fazer o exercício de explorar e compreender a motivação por detrás dos mesmos, vem sempre aqui deste sítio de proteção ou defesa de uma necessidade. Seja esta de segurança, de obtenção de recursos (alimentares ou de território), de proteção, entre outros tantos. Somos no final de contas todos semelhantes neste aspeto, as nossas necessidades, que nos move e condiciona os nossos atos, e que de forma infeliz nos leva muitas vezes para um campo de violência, principalmente quando acreditamos que não existe outra opção.

Trazer a consciência para a ação: reduzir a violência no meu sistema

Por mais que o desespero, raiva, frustração, indignação, nos possam levar para este sítio de reatividade, de violência, de acreditarmos que não existe outra opção, a realidade é que, até termos uma arma apontada à cabeça (literalmente), como foi, tragicamente, o caso da Ucrânia com a Rússia, existem sempre opções, há sempre solução, mesmo que não a consigamos ver.
No nosso dia-a-dia, e numa realidade menos extremada ou complexa, existem algumas coisas que podes fazer para quebrar com o ciclo de violência no teu sistema (pessoas próximas de ti) e conseguires encontrar alternativas, a formas de te expressares que não agregam e só criam mais separação:

  • Processa as tuas emoções: este é talvez o aspeto mais importante para saíres de um registo violento, é estares com as tuas emoções, sentires o que sentes, perceberes o que essas emoções te querem dizer e acima de tudo, não te expressares ou agires de forma impulsiva com base na intensidade dessas emoções.
  • Procura espaços seguros para partilhar as tuas ideias e frustrações: subestimamos o poder de partilhar e pedir colo, apoio, aqueles que sabemos nos vão acolher e escutar sem julgamentos, críticas. Por vezes, processar emoções, encontrar soluções, também passa por ter várias conversas, desabafos, com aqueles em quem confiamos e assim também evitar, levar a quente, para o mundo, as ideias que queremos defender.
  • Não entres em correntes de ódio: as correntes de ódio, como vimos em cima, ao falar de violência redentora, não são exclusivas de grupos extremistas anti-direitos humanos, também são muito utilizadas e difundidas por aqueles que defendem esses mesmos direitos. Algo que vem de um lugar, mais uma vez, de raiva não processada e de reatividade. Fazer parte ou promover ideias, textos, posts, o que for, de quem também enaltece a violência ou utiliza um discurso violento para defender as suas ideias, é uma forma de contribuir para a polarização e escala da violência. Não fazer parte é uma forma de reduzir esse movimento.
  • Reúne todas as visões: Por mais que nos custe admitir, uma paz sustentável, que perdure no tempo, só é atingível, se todas as partes forem incluídas na solução. E para encontrar uma solução para o problema que queremos resolver, precisamos ter uma perspetiva ampla sobre o mesmo, isto é, precisamos perceber a posição de todos os envolvidos. Quanto mais nos focarmos na solução e sairmos do pensamento de separação, de combater os “maus”, maior será a probabilidade de encontrarmos mais soluções e que nos afastam da violência.
  • Transforma o teu discurso: Por fim, mas não menos importante, mudar a forma como te expressas, como comunicar, é fundamental. É verdade que discursos negativos ou que exaltam emoções mais fortes (como o ódio e a raiva), podem mais rapidamente converter apoiantes, mas serão apoiantes que se movem do mesmo lugar que queremos colmatar, o lugar que nos leva para a polarização e violência. Ao invés de agregares apoiantes pela promoção de um alvo a abater comum, inspira, através das tuas palavras, a procurarem soluções em conjunto. Para isso, as ferramentas da Comunicação Não Violenta e da Democracia Profunda poderão ser poderosas aliadas.

Para terminar, queria apenas reforçar que, embora muitos de nós possam sentir que é impossível a nossa contribuição pequena contribuir para um mundo melhor, mas a verdade é que o mundo em que vivemos, e a violência a que assistimos, é na realidade o somatório da ação de cada uma das pessoas que compõem este planeta, então se cada um de nós começar por fazer a sua parte, ainda que não nos seja visível no imediato, eu acredito que terá sim um grande impacto! 

Queres contribuir para a redução da violência? Junta-te ao nosso projeto social de Educação para a Paz e Não Violência:

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